ÁSIA/IRAQUE - A um ano da queda de Saddam, as diversas comunidades religiosas entre líderes tradicionais e a força dos novos grupos radicais

Sábado, 24 Abril 2004

Bagdá (Agência Fides) - O cenário que se registra, a um ano da queda de Saddam Hussein, no Iraque, é heterogêneo: o emergir de novos grupos políticos, o despertar de movimentos religiosos tradicionais, o nascimento de novas formações, o retorno à pátria de líderes religiosos exilados, a influência de países confinantes, determinam um quadro no qual, muitas vezes, âmbitos políticos e religiosos se sobrepõem. No interno destes, cada grupo age para conquistar um espaço próprio no Iraque do futuro.
Uma das dinâmicas mais evidentes refere-se aos muçulmanos xiitas: através de manifestações de massa e organizações territoriais, os muçulmanos xiitas iraquianos estão reafirmando a sua identidade, depois de anos de brutal repressão, nos tempos da ditadura de Saddam Hussein. Como confissão majoritária (cerca de 63% da população iraquiana), os xiitas manifestaram anseios de participação no futuro do novo Iraque. E isso gerou problemas difíceis de serem resolvidos.
Um dos problemas surgidos é o modelo de nação teocrática que a comunidade xiita defende, apelando-se à necessidade de um estado islâmico. Ao mesmo tempo, alguns líderes pedem o imediato abandono das tropas da coalizão do solo iraquiano. Dentro da comunidade xiita, emergiram no último ano alguns jovens líderes radicais que desafiaram o clero tradicional, mais moderado, composto por muitos líderes islâmicos recém-retornados do exílio. Outro desafio a se considerar é a importância da influência do vizinho Irã, nação totalmente xiita, e dos Hezbollah libaneses.
Por outro lado, a comunidade iraquiana sunita, representada por 34% da população islâmica, ficou penalizada no pós-Saddam, pois nos tempos do partido Baath, era identificada como grupo detentor do poder político. Depois de reorganizada, no fim das hostilidades, um ano atrás, teve que enfrentar a grande ascensão do Islamismo xiita, despertado após a dura repressão dos anos da ditadura de Saddam. Neste processo de reorganização, sofreu infiltrações de elementos e grupos wahabiti, com a sua ideologia antiocidental de Al Qaeda.
Segundo alguns analistas, a ideologia antiocidental e contrária à presença dos militares estrangeiros em território iraquiano ajudou a unir as comunidades muçulmanas xiita e sunita, historicamente divididas e em contraste entre si. Algumas interpretações falam de uma “aliança temporária” entre os dois ramos islâmicos, ou melhor, entre alguns grupos xiitas e sunitas, com objetivos comuns, sobretudo o de reconquistar a direta soberania política no país.
Divididos basicamente em duas facções, os curdos, majoritariamente sunitas, esperam poder participar do governo do país, não obstante as rivalidades internas existentes entre seus dois grupos: o Partido Democrático do Curdistão (PDK), liderado por Massoud Barzani, e a União Patriótica do Curdistão (PUK), guiado por Jalal Talabani. Ambos os líderes estão no Conselho governamental iraquiano e dispõem de uma força militar autônoma, formada por guerrilheiros peshmerga.
Neste cenário, a comunidade cristã, em suas diversas articulações, reiterou sua posição de plena participação no futuro dos povos iraquianos, sua intenção de construir relações de fraternidade com outras comunidades religiosas, e de querer oferecer uma contribuição na construção do novo Iraque. Nota-se ainda o grande esforço dos cristãos em obras de solidariedade através da Caritas Iraque, com as faixas mais pobres da população, muitas vezes não cristãos.


Xiitas
Das formações xiitas mais relevantes, o movimento Daawa, fundado em 1950, é o mais antigo movimento islâmico do Iraque. Depois de ter vários de seus líderes assassinados na época de Saddam, foi dissolvido e suprimido, levando muitos xiitas à clandestinidade. Liderado pelo xeque Mohaammed Nasseri, retornado do exílio ao Irã depois da guerra, o movimento Daawa possui dois membros no Conselho governamental iraquiano. Nasseri sempre sustentou que “o período de ocupação das forças da coalizão não deveria ser maior que seis meses”.

Outro movimento xiita emerso no último ano é o Conselho Supremo da Revolução no Iraque (Sciri). Seu líder, Muhammad Baqr al-Hakim, foi morto em um atentado em Najaf, em agosto de 2003. Como milhares de seus fiéis, Hakim também havia retornado do exílio, no qual Saddam havia-lhe confinado. Antes de sua morte, ofereceu apoio ao Conselho governamental iraquiano, legitimando-o junto à comunidade xiita. Em seu lugar, como líder, está agora seu irmão, Abdel Aziz, que entretém relações muito estreitas com o Irã, e que obteve para seu movimento uma cadeira no Conselho governamental. O Sciri conta com um braço armado, conhecido como Brigadas Badr, composto por cerca de 10.000 homens.

Um dos grupos xiitas mais radicais é o liderado por Moqtada al Sadr, 32 anos, filho de um líder xiita assassinado pelo partido Baath nos anos da ditadura. Sadr, que se opõe à liderança xiita tradicional, estabeleceu sua base na cidade de Najaf, e se opõe firmemente à que define “ocupação americana”. Hoje procurado pelas autoridades da coalizão, Sadr, em seus discursos, sempre invocou a lei islâmica, recorrendo ao orgulho nacional iraquiano, e posicionando-se em contraste com o Grande Aiatolá Ali Al-Sistani, maior autoridade xiita presente no Iraque. Sadr também recrutou uma milícia de cerca de 10 mil homens e suas posições tiveram muita repercussão e popularidade no bairro xiita de Bagdá, rebatizado “Sadr City”. Recentemente, chegou a ameaçar as forças da coalizão de utilizar camicazes, caso os militares entrarem nas cidades santas de Najaf e Kerbala. Hoje, segundo os observadores, está isolado do resto da comunidade xiita.

O líder espiritual xiita mais importante no Iraque é Ali Al Sistani, 78 anos, um dos mais moderados em relação às forças de coalizão. Al Sistani passou muitos anos preso, por ter recusado o exílio. Durante a guerra, foi favorável à intervenção da coalizão, e hoje, está sendo desafiado por muitos jovens expoentes que querem espaço na comunidade xiita. Embora tenha feito restrições ao projeto da Constituição iraquiana, elaborado recentemente, evitou criticar a obra do Conselho governamental, do qual alguns de seus simpatizantes são integrantes. Al Sistani respeita a separação entre religião e Estado e rejeita o recurso às armas, mas pede o respeito do prazo marcado para a passagem do poder aos iraquianos, mesmo porque, na comunidade xiita, aumenta o descontento em relação à política da coalizão. Segundo numerosos observadores, Al Sistani mantém uma posição “de espera”: não quer entrar em conflito com a administração norte-americana, que libertou o país da ditadura de Saddam, mas aguarda a passagem do poder para usar a influência da consistência numérica da comunidade xiita no novo cenário iraquiano, através de um governo nacional, legitimamente eleito.


Sunitas
Entre os sunitas, emergiu o grupo ligado a Mohsen Abdel Hamid, teólogo islâmico, membro do Conselho governamental iraquiano. Hamid lidera o Partido Islâmico do Iraque, que pertence à facção dos irmãos Muçulmanos. Sua posição moderada contrasta com a de Ahmad el Kebeisey, professor de Estudos Islâmicos na Universidade de Bagdá, um dos expoentes da oração de Sexta-feira na mesquita de Abi Hanifa, no distrito sunita de Bagdá. Várias vezes, o imã incitou ao ódio antiamericano e manifestações de protesto contra as forças da coalizão.

O perdurar dos combates e seqüestros deu relevo a novos atores no cenário iraquiano. Entre estes, a Associação do Clero Sunita, que se destacou quando ajudou a alcançar a frágil trégua entre rebeldes sunitas e as tropas americanas na cidade de Falluja, e por ter contribuído para a libertação dos sete chineses seqüestrados e mantidos em cativeiro por alguns dias.

O xeque Harith al Dhari, um dos líderes do movimento, explicou que “a organização é religiosa, mas também política e social, e age no interesse do país”. A Associação veio à tona depois do vazio criado na comunidade xiita com o fim da guerra. Sua ação reflete também um comportamento nacionalista e compreende alguns importantes ulama, como os das mesquitas Abi Haanifa e Abd al Kadr a Baghdad, sendo assim uma instituição muito influente. Mesmo não representado no âmbito do Conselho governamental, a organização o legitimou, declarando-se próxima às posições do Partido Islâmico do Iraque. Mantém relações também com a comunidade curda e afirma buscar boas relações com os xiitas.


Curdos
Divididos basicamente em duas facções, os curdos, majoritariamente sunitas, esperam poder participar do governo do país, não obstante as rivalidades internas existentes entre seus dois grupos: o Partido Democrático do Curdistão (PDK), liderado por Massoud Barzani, e a União Patriótica do Curdistão (PUK), guiado por Jalal Talabani. Ambos estão no Conselho governamental iraquiano e dispõem de uma força militar autônoma, formada por guerrilheiros peshmerga.

As populações curdas, deslocadas no Nordeste do Iraque, contam cerca de 4 milhões de pessoas convertidas ao islamismo sunita depois da ocupação do Curdistão pelo exército islâmico, na primeira metade do século VII. Antes do Islamismo, a religião mais difundida era o zoroastrismo, mas os curdos conheciam também outras religiões monoteístas e conviviam com comunidades judaicas (desde o século VI), e cristãs (desde o século II). Hoje, há poucos judeus entre os curdos, enquanto a comunidade cristã é muito presente, assim como é difundido também o yazidismo.
A conversão do povo curdo ao Islamismo não derivou tanto da atração pelo ensinamento espiritual árabe, mas sim do desejo de fuga das injustiças de uma sociedade feudal e da aspiração por uma sociedade baseada na equidade, fraternidade e solidariedade. No século XII, os curdos foram englobados ao Império Otomano. O fim do Império, em 1918, deu origem ao problema curdo. Além da lábil linha de confim do Império, houve o advento do mandato britânico, seguido por fronteiras estatais fixas e impenetráveis (Turquia, Síria, Iraque, Irã), que impediram o funcionamento do grupo étnico curdo, como entidade unida. Assim, enquanto sob o Império, os curdos gozavam de privilégios, por serem “guardiões” do confim, começaram a ser vistos como obstáculo à homogeneização dos territórios nacionais.
Hoje, o Islamismo constitui uma verdadeira força na civilização curda: organiza a sua vida social, cultural e política, determina a escala de valores morais e sociais, na educação e na formação das famílias. Os homens de religião têm uma posição social relevante na sociedade curda. Muitas vezes, o Mullah é a única pessoa instruída da aldeia. Os líderes religiosos tiveram um papel importante também no movimento de libertação nacional curdo moderno, como o teve o Mullah Mustafà Barzani (1931-1978). Este fenômeno fortaleceu as bases do movimento nacional, delineando as dimensões ideológicas e políticas da luta dos curdos por um Estado nacional, para conseguir o reconhecimento da etnia curda em países muçulmanos como a Turquia, a Síria, o Iraque, e Iran. Com a morte de Barzani, terminou a fase da autoridade religiosa e civil, dando início a uma administração leiga.
Por suas aspirações de autonomia (e certas vezes, de secessão), os curdos foram perseguidos pelo regime de Saddam Hussein. Depois da instituição da no fly zone, a zona interditada ao vôo estabelecida pela ONU em 1991, o Curdistão iraquiano ficou sob proteção internacional e os curdos conseguiram obter uma certa autonomia.


Assírios
Também os cristãos Assírios recomeçaram a esperar viver sua especificidade religiosa e cultural depois da queda de Saddam. Um de seus representantes, Younadem Kana, é o único cristão presente no Conselho governamental. A comunidade segue a Igreja Assíria do Oriente, e é muito próxima à Igreja Católica Caldéia, também oriunda da pregação de São Tomás, no século I d. C. Perseguidos fortemente pelo regime Baath, encontraram hoje uma certa liberdade, que se exprime no culto, nos costumes e na cultura.
A Igreja Assíria do Oriente é uma Igreja autônoma, que não está em comunhão com Roma e nem com as Igrejas ortodoxas. Tem origem na evangelização de dois discípulos do Apóstolo Tomás, Mar Addai e Mar Mari e, do I ao IV séculos d.C, se difundiu com o surgimento de comunidades e mosteiros em todo o território oriental, na área que parte da atual Síria e se estende até o Iraque e o Irã. Esta Igreja, chamada Igreja Assíria do Oriente, obteve autonomia com os Concílios de Seleucia, em 410, e Markbata, em 424, com a possibilidade de eleição do Patriarca, com o título de “Catholicos”.
Em meados do século XV, a Igreja Assíria viveu um período de fechamento e decadência. No início de 1553 - quando o Papa Julio III nomeou Simão VIII como “Patriarca dos Caldeus”- houve a cisão entre a Igreja Assíria e a Igreja Caldéia, que perdura ainda hoje.
Após as cisões, as relações entre as comunidades Caldéia e Assíria melhoraram: a nova era de diálogo e boas relações levou à declaração cristológica, assinada conjuntamente pelo Papa e o Patriarca Mar Dinkha IV, em Roma, em novembro de 1994. Em agosto de 1997, o Santo Sínodo da Igreja Caldéia e o da Igreja Assíria instituíram uma Comissão para o Diálogo, com o objetivo de discutir a cooperação pastoral, em todos os níveis.
Um dos pontos particularmente sensíveis da história dos Assírios é a perseguição sofrida em 1933, logo após a independência do Iraque (1932). Vistos como hostis ao poder, os assírios foram massacrados pelo exército iraquiano. Para recordar o evento, em 7 de agosto, os assírios celebram o Dia do “Martírio Assírio”. Atualmente, uma comunidade de cerca de 70 mil Assírios vive no Norte do Iraque, aonde conserva sua própria identidade cultural, lingüística e religiosa. Nos anos 70, os Assírios obtiveram o ensino da língua siríaca (ou aramaica), nas escolas primárias assírias, na esteira da decisão do governo de Bagdá de conceder direitos culturais e administrativos aos assírios e turcomanos.

Católicos
“Todos os cristãos iraquianos rezam e se empenham para que a convivência entre os credos iraquianos, que dura 1600 anos, não se deteriore” - disse à Agência Fides Dom Athanase Matti Shaba Mattoka, Arcebispo da Igreja siríaca de Bagdá, explicando a situação da comunidade cristã no novo cenário iraquiano. “Estamos convencidos que o diálogo é o caminho para sair da violência” - acrescentou.
Na era pós-Saddam, a comunidade cristã manteve o seu espaço social e político, lutando pela edificação de um Estado leigo e pluralista, respeitoso das minorias religiosas. Os cristãos acolheram favoravelmente a aprovação da nova Constituição do Iraque, ocorrida em março passado, definindo-a “um passo positivo seja para a unidade do país, como para o nascimento de um novo Iraque civil, que respeite todas as minorias” - como destacou Padre Nizar Semaan à Agência Fides.
“Prevaleceu a visão de um Iraque leigo, mas com valores religiosos, porque a laicidade não é contra a religião”, explicou Pe. Nizar. “Esta constituição pode ser uma base sólida para um futuro de democracia no país, na qual prevaleça o respeito pelo homem, independente de sua pertença religiosa ou ética” - acrescentou, notando que para os cristãos, “o mais importante é que o texto da Constituição não se baseia na lei islâmica”.
O sacerdote comentou: “Acredito que esta Constituição será um exemplo para todo o Oriente Médio. Os iraquianos devem sentir-se orgulhosos de ter uma constituição como esta, que deposita o fundamento para a convivência civil, superando as diversidades de etnia e religião. Hoje, no novo Iraque, não existem mais cidadãos de primeiro e segundo grau, mas todos são iguais, em seus direitos e deveres. Para nós, cristãos, a esperança é que nos sentamos mais seguros e livres para viver nossa fé. Desejamos ser parte ativa na edificação de um novo Iraque”.
A Carta Constitucional aparentemente atendeu as exigências da comunidade cristã, expressas claramente no outono passado pelos Bispos do rito Caldeu (majoritário entre os católicos iraquianos). Numa carta enviada ao Conselho governamental, pedia-se a garantia de todos os direitos, religiosos, sociais, civis e políticos, para os cristãos no Iraque. A população Caldéia - recordavam os Bispos - representa o terceiro grupo étnico no Iraque, depois de árabes e curdos: a presença em campo profissional, social e administrativo sempre foi importante no Iraque. Por isso, os Bispos pediam que fosse reconhecida a importância da comunidade Caldéia na edificação do novo Iraque. “Expressamos nossa solidariedade - escreviam - a todos os cidadãos iraquianos, árabes, curdos, e de todas as etnias e grupos religiosos, vivendo em pacífica fraternidade, especialmente com os outros grupos cristãos assírios, siríacos, armênios e latinos, no esforço em construir um novo Iraque democrático, livre e próspero”.
Não obstante o interesse comum positivo, as recentes tensões no país geraram temores na comunidade cristã, que foi várias vezes ameaçada por grupos extremistas, em diversas cidades iraquianas, especialmente em Mosul. A luta política entre sunitas e xiitas - notam fontes da Fides - não oferece perspectivas tranqüilas para os cristãos. Algumas famílias cristãs estão deixando Bagdá para transferir-se ao Norte, área de Mosul, aonde se sentem mais seguras.
Os cristãos insistem muito por sua identidade iraquiana: de fato, a presença cristã nesta parte do mundo, que vai do Iraque até a Índia, é muito antiga e decorre da pregação do Apóstolo Tomás, que depois da morte e da Ressurreição de Jesus, partiu de Jerusalém em 40 d.C. e evangelizou, nos anos 42-49, todas as populações do Oriente Médio.
Os cristãos de hoje descendem das populações que não se converteram ao Islamismo no século VII século, nos tempos da conquista árabe. 70% dos cristãos iraquianos pertence à Igreja Caldéia. No total, os cristãos são cerca de 800 mil, ou seja, cerca de 3% da população. Subdividem-se em católicos e ortodoxos. Os protestantes chegaram ao Iraque poucos anos atrás.
As comunidades católicas no Iraque são de quatro ritos:

- Caldeus
Constituem a grande maioria entre os cristãos locais. A sede do Patriarcado está em Bagdá. Depois do falecimento de Sua Beatitude Raphael I Bidawid, o novo Patriarca de Babilônia dos Caldeus é Sua Beatitude Mons. Emmanuel Karim Delly, 76 anos. Recém-nomeado, em 3 de dezembro de 2003, o Patriarca disse à Fides: “Estamos todos vivendo uma condição difícil e pedimos paz e tranqüilidade. Portanto, é necessário restabelecer imediatamente as condições de segurança, requisito para o retorno da normalidade”. “A violência que mancha o Iraque - continua Mons. Delly - deve ser condenada sem meios termos”. Em um contexto de maioria islâmica, a Igreja Caldéia vive e celebra sua fé com grande vitalidade, dedicando-se sobretudo à catequese e à educação: em Bagdá, existe um Seminário Patriarcal, e foi fundado há pouco o Colégio da Babilônia, que é um Colégio Patriarcal, afiliado à Pontifícia Universidade Urbaniana, da Congregação para a Evangelização dos Povos. Através de estudos teológicos e filosóficos, nele formam-se seminaristas e leigos para atuar no território.
A paróquia desempenha um papel importantíssimo para os cristãos Caldeus: é a realidade em que exercem e vivem, plenamente, a própria fé. Por isso, o trabalho pastoral é precioso: embora com dificuldades econômicas, hoje é florescente. As paróquias, de fato, foram construídas de acordo com as possibilidades da Igreja, mas hoje, com o crescimento numérico da comunidade, as necessidades aumentaram.
A comunidade Caldéia, de fervorosa caridade, assiste numerosas famílias pobres, cristãs e muçulmanas, em sua sobrevivência, distribuindo alimentos, vestuário e ajudas de vários gêneros, todos os meses. Na liturgia Caldéia, a língua oficial é o aramaico, língua litúrgica, teológica e clássica do Cristianismo de tradição semítica. Mas já que o árabe é falado correntemente por fiéis e jovens, e o aramaico não é completo nos sinônimos e na terminologia, a celebração da Santa Missa é bilíngüe. O catecismo é feito em árabe, com exceção dos vilarejos das montanhas do Norte, nos quais se usa a língua daquela região, o aramaico.
Há no Iraque também duas comunidades de religiosas Caldéias: uma das Irmãs do Sagrado Coração e a outra das Irmãs Caldéias Filhas de Maria Imaculada. A Igreja Caldéia tem também uma instituição monástico-missionária. No início, os monges caldeus abriram conventos e evangelizaram as regiões montanhosas no Norte do Iraque, como o fazem ainda hoje, com o apostolado em aldeias curdas, o ensino nas escolas e o catecismo. Em seguida, desceram a Mosul e enfim a Bagdá, aonde se situa a sede do Superior Geral. A congregação tem hoje quatro conventos no Iraque e um em Roma, além de uma missão na América.
Os cristãos de rito caldeu no Iraque são mais de 700 mil, e um igual número encontra-se espalhado pelo mundo.

- Sírio-antioquenos
São uma comunidade de cerca de 75 mil fiéis, divididos em duas dioceses entre Bagdá e Mosul. O Bispo de Bagdá é Dom Athanase Matti Shaba Matoka, enquanto Dom Basile Georges Casmoussa lidera a comunidade de Mosul. Depois da missão dos jesuítas e dos franciscanos capuchinhos, iniciada em Aleppo (Síria) em 1626, uma parte da Igreja sírio-antioquena, chamada “Jacobita”, decidiu unir-se à Igreja de Roma, formando assim a Igreja sírio-antioquena católica, que manteve toda a herança patrística e litúrgica. No Iraque, os sírios católicos estão espalhados de norte a sul: em Basra, há uma pequena comunidade; em Bagdá, a comunidade tem cerca de 30 mil fiéis; em Kirkuk e Mosul, quase 45 mil fiéis. As línguas usadas na liturgia são seja o árabe, sobretudo nas grandes cidades, como o aramaico, nas aldeias ao redor de Mosul, como o vilarejo de Karakosh, onde se concentram quase 25 mil fiéis. Recorda-se que o Patriarcado dos sírios católicos é em Beirute, no Líbano.

- Armênios
As comunidades armênias presentes no Iraque provêm da imigração e das deportações forçadas das populações armênias, ocorridas em 1915, em seguida aos massacres ordenados pelo regime de Giovanni Turchi. A Igreja armênia se inspira na figura de São Gregório, o Iluminador, que cristianizou a Armênia no século III. Divide-se entre ortodoxos (ou Apostólicos) e católicos.
Em Bagdá, as religiosas armênias administram uma escola de mais de 800 alunos, metade dos quais armênios, e metade, muçulmanos. A pequena comunidade católica Armênia presente no Iraque (2 mil pessoas) é liderada pelo Administrador Patriarcal, Dom Andon Atamian. Antes dos anos ’90, os armênios (católicos e apostólicos) no Iraque eram de 20 a 30 mil. Na última década, a comunidade reduziu-se muito em função da marginalização e da pobreza.

- Latinos
Há cerca de três séculos, um grande grupo de missionários latinos trabalha no Iraque: religiosos e religiosas, que se encontram em Bagdá e no norte do País, estão engajados na pastoral em paróquias locais, atuando na catequese de jovens, na celebração dos Sacramentos, nas atividades de solidariedade com os pobres. Os missionários de rito latino aprendem a falar a língua árabe e a conhecer a tradição litúrgica e ritual caldéia, inserindo-se plenamente na cultura local.
Estão presentes no Iraque os Padres Redentoristas, Dominicanos, Carmelitas, Salesianos, os monges Antonianos Caldeus provenientes do Líbano. Entre as Congregações religiosas femininas, estão presentes: as Irmãs Franciscanas Missionárias do Coração Imaculado de Maria; as Irmãs Dominicanas da Apresentação da Virgem de Tours (que administram o Hospital de São Rafael, em Bagdá); as irmãs Dominicanas de Santa Catarina de Siena; as Pequenas Irmãs de Jesus; as Missionárias da Caridade, que, trabalhando segundo o carisma de Madre Teresa de Calcutá, ocupam-se de crianças portadoras de deficiências. O líder da pequena comunidade católica de rito latino (2.500 pessoas, presentes em sua maioria em Bagdá), é o Arcebispo Dom Jean Benjamin Sleiman.

Os números dos Católicos: Caldeus: mais de 700.000; Sírio-antioquena católicos: 75.000; Armênios: 2.000; Latinos: 2.500

(PA) (Agência Fides 24/4/2004)


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